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domingo, 7 de março de 2010

Aqui jaz, as mãos invisíveis do mercado


Artigos
Lilian Ribeiro de Lima
Graduanda em Ciências Sociais pela UNESP

Aqui jaz, as mãos invisíveis do mercado
A experiência democrática tal qual se erigiu nos países subdesenvolvidos ao longo das últimas décadas do século XX, deixa marcas profundas na realidade e composição atual do cenário estrutural por todos seus quilômetros percorridos desde a América Central, visitando o Caribe e prolongando-se até o Cone Sul. Demonstrando contradições claras às imposições do receituário liberalizante sugerido pelos capitalismos centrais, bem como suas extensões financeiras responsáveis por romper fronteiras nacionais, finalidades inerentes às ditas benesses da globalização; o desenvolvimento sócio-econômico e a estabilidade política, converteram-se para os latinos em seus extremos opostos, tal como nominalmente periferia opõe-se diretamente ao centro. Neste contexto, a maximização do mercado em consonância à minimização do Estado, atinge o ápice das contradições e insatisfações ao modelo político democrático vigente na América Latina, anunciando perspectivas alarmantes de uma inadequação, que revela sua verdadeira faceta e efetiva constatação de reivindicações alternativas.
Guiados pelas mãos invisíveis do mercado, sob a égide da ideologia liberal, as antigas colônias européias adentraram no abismo de um retrocesso social sem precedentes, evidenciado por desigualdades sociais que lideram o ranking mundial, extrema pobreza e lacunas profundas entre a esfera pública e a sociedade civil, rompendo em definitivo com os verdadeiros fundamentos do Estado de Direito.A supervalorização das funções do mercado expressa através da desregulamentação e privatização de abrangentes esferas da vida, traz em si a polarização da liberdade civil. Entrelaçam-se, assim, sob o mesmo tecido social pontos esparsos de cidadãos livres para desenvolver suas capacidades humanas, em detrimento da predominante presença de cidadãos desabilitados e alijados das condições necessárias para coexistir sob a lógica competitiva suscitada pelo sistema capitalista.
O modelo político verdadeiramente democrático baseado na igualdade de todos, não somente via instrumentos jurídicos formais, mas de sobre maneira, em possibilidade de acesso a componentes inalienáveis dos cidadãos tais como educação, saúde, informação e seguridade social, reúne as condições vitais capazes de sugerir liberdade individual para o desenvolvimento humano em uma sociedade de classes sob preceitos significativamente mais equânimes. Tais garantias, tão caras à sociedade ocidental moderna e aos princípios fundadores da democracia, trilharam um caminho perverso ao longo dos avanços rumo ao estágio global da economia de mercado, e nesta trajetória o Estado perdeu em funcionalidade, ficando em contrapartida para a sociedade o ganho em desigualdade social, mediante a inexistência de um componente neutralizador e norteador das relações entre interesses econômicos e sociais. De tal forma, segue uma evidente ascensão daqueles que detém as condições necessárias para exercer sua liberdade de mãos dadas ao mercado, em desqualificação da liberdade da expressiva grande maioria dos cidadãos deficientes de tamanha mobilidade de seus membros superiores. Dita em outras palavras esta analogia pode pressupor que, dentre os meandros do caminho guiado pelas mãos do mercado polariza-se o cenário entre protagonistas, que caminham em paralelo à dinâmica do capital, e figurantes alijados de toda sorte do processo de aquisição de requisitos básicos para competir em condições efetivamente igualitárias.
Em capítulos posteriores a este contexto de agigantamento do mercado, é que as famigeradas mãos invisíveis demonstram sua face, anunciando em múltiplas tonalidades e contrastes, que as diferenças compõem o lamentável corolário do mergulho nas ondas da liberalização, e desregulamentação, cegamente aderidas pelos países latino-americanos. A concentração em âmbitos econômicos, sociais e culturais, em benefício do mercado demonstrou ser insustentável uma economia de mercado auto-regulamentada, sobretudo, por romper com os reais valores morais do modelo político democrático.
A rendição e o conformismo não podem configurar a posição da sociedade civil diante dos ditames do mercado em sua ação, por séculos, imperceptível e silenciosa. A realidade desigual clama e possibilita a busca por novas formas de vida democrática, diante das renovações nas estruturas e mecanismo democráticos, nas quais os referendo e plebiscitos representam avanços significativos. A lacuna entre cidadão e poder público, bem como a contradição inerente entre democracia e capitalismo de mercado, pode ser preenchida em prol do desenvolvimento de condições equânimes significativas dentro do jogo capitalista desigual.
A estrutura política verticalizada, que vai desde o poder público, perpassando pelos seus mecanismos de controle, a atuação de partidos políticos, e finalizada na sociedade civil (a ordem não altera o produto), pode reestruturar-se e estabelecer um caminho guiado pelas mãos de todos os cidadãos, sendo estes expressos através dos representantes eleitos, tais como a democracia representativa sugere. As imposições anunciadas pela ideologia liberal, convenceram por longos períodos acerca do fim da história e da impossibilidade de criar alternativas ao modelo político-econômico e social vigente, entretanto, as profundas mazelas restante desse acordo feito às escuras penetram no limiar da crise democrática latino-americana como anúncio de novos tempos.
Eliminar o distanciamento entre Estado e sociedade civil, através do fortalecimento de instituições e mecanismos democráticos, com vistas a derrubar o gigantesco mercado e suas corporações transnacionais das funções as quais fora retirado o candidato mais próximo e eficaz para intervir na esfera pública; o Estado,é imprescindível para reduzir a alarmante polarização da liberdade entre àqueles, que detém os modos de produção e acesso a recursos básicos de subsistência, e aqueles que circundam pelas margens do tecido social e da participação democrática.
O mito do desenvolvimento social e econômico propagado pelas mãos invisíveis do mercado está em vias de ser revertido como possibilidade única, em contexto tal como se dá na total inadequação escancarada nos países latino-americanos. O novo caminho é longo e ser otimista em tempos como estes, por vezes parece antiquado. Contudo, de todos o males o pior; a permanência do crescimento irrefreável das receitas dos grandes conglomerados transnacionais, em face da perpetuação de índices exorbitantes das desigualdades econômicas, extrema miséria e injustiça social, e marginalização do componente principal do modelo político democrático; a esmagadora maioria dos cidadãos.

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