Novas abordagens entre a História e a Cultura Política.
Pedro Ernesto FagundesDoutor em História Social (UFRJ). Professor do Centro Universitário São Camilo – ES e da Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim – ES. pefagundes@uol.com.br
Resumo:
Esse trabalho analisa a utilização da História Política nas investigações do campo historiográfico. Esse campo da história tem nos últimos anos concentrado seus objetos de estuda nas questões ligadas a história do Estado, das eleições, do sufrágio universal e das escolhas dos eleitores. O movimento de retomada da História Política fez com que ocorresse de uma significativa ampliação das fontes de análise, entre elas as fontes jornalísticas. Dessa forma, esses novos desafios fizeram com que o estudo da história do tempo presente, sobretudo o produzido pela mídia, passasse a fazer parte das investigações na área da História.
Palavras-chave: História Política; Tempo presente; mídia.New approaches between History and Political Culture.
Abscract:
This paper analyzes the use of political history in the investigations of the historiography. This field of history has in recent years concentrated its objects of study on issues related to the history of the state, elections, universal suffrage and the choices of voters. The movement of resumption of political history that has occurred with a significant expansion of sources of analysis, including journalists' sources. Thus, these new challenges have made the study of the history of the present time, especially that produced by the media, would become part of the investigations in the field of history.
Keywords: Political History; this time; media. Inicialmente cabe ressaltar que a opção por abordar um tema da História Política brasileira no que tange, especialmente, as eleições presidenciais de 1989 poderia ser considerada uma árdua tarefa e que, certamente, se perderia no terreno árido das críticas. Essa resistência da comunidade acadêmica à História Política era muito comum pois, esse repúdio é fruto de uma visão que enquadrava os objetivos e metas da chamada “antiga ou tradicional” História Política como sendo apenas o estudo do Estado-Nação, dos comportamentos individuais dos grandes personagens. Assim, compreendemos os motivos que levaram a História Política a ser colocada “de lado” por muitos historiadores.
O “resgate” da História Política é um movimento comandado pela historiografia francesa, em geral, e por René Rémond, em especial. Esses autores desempenharam papel de destaque no “rejuvenescimento” da História Política. Para BORGES (1992) foi graças a esse trabalho de renovação da historiografia francesa que a noção de político se ampliou e passou a incluir o comportamento das pessoas diante da política, a evolução de suas atitudes ao tomarem posição, deliberada e consciente, para intervir nas áreas em que se decidem seus destinos.
Dessa forma, a História Política já guardava em seu nascedouro a marca clara de uma disciplina que buscaria os grandes embates do Estado, pelo poder e em busca das conquistas ou das revoluções que buscavam transformar a sociedade, ou seja, essas eram as fontes pioneiras de suas pesquisas. Assim, de acordo com RÉMOND (1996), através de uma metodologia Positivista, a História Política Tradicional relatava as glórias dos “grandes governantes” do passado. Porém, essa forma de fazer história, que foi hegemônica por um longo período, sofreu um abalo que há cinqüenta anos atingiu todos os campos da História.
A partir do surgimento da Nova História a História Política passa a ser “acusada” de, como já foi dito, ser uma história tradicional, conjuntural, obsoleta, desusada, factual, subjetivista, psicologizante, enfim, passa a ser impiedosamente criticada e refutada . Na visão do autor essa recusa pelo político fez com que no meio acadêmico a História Política fosse execrada e descartada e as questões econômicas e as relações sociais passassem a ditar todo o rumo das pesquisas históricas.
A reviravolta que possibilitou à História Política ter novamente um papel de destaque dentro do campo histórico foi, sem dúvida, a evolução e o aumento das atribuições do Estado, ou seja, para o autor o universo das questões políticas também se expandiu e diversificou a participação e o número de atores sociais na vida política.
Dessa forma, surge a brecha para a História Política, pois, esses novos temas analisados apenas pelo prisma econômico ou social não conseguiam ser plenamente compreendidos fora do ângulo historiográfico, ou seja, não conseguiam dar conta das novas demandas do campo político. A História Política retoma seu lugar de destaque, porém para p autor, a História Política ao olhar para esses novos fatos acaba tendo que renovar também sua metodologia para poder interpretar com rigor a realidade política e ideológica de sua época.
No caso, a renovação foi provocada, suscitada pela discussão dos conceitos clássicos e das praticas tradicionais. E nesse ponto, a constatação de que foi objeto a história política lhe foi salutar: o desafio fustigou a imaginação e estimulou a iniciativa. ( RÉMOND, 1996, p.26)
Além da mudança em seus conceitos a História Política irá enfrentar um grande debate sobre a fundamentação teórica e a metodologia de seus estudos, em especial, para o autor no que diz respeito ao sentido histórico das eleições, ou seja, sobre caráter passageiro e localizado de cada pleito ou, ao contrário, se existiria um comportamento ou padrão entre as várias parcelas da sociedade contemporânea durante um processo eleitoral.
O estudo do sufrágio universal, da abstenção, da participação popular e dos trabalhadores, enfim, todos esses aspectos são vistos e revistos pelos historiadores do político e a partir daí o ato eleitoral passa a ser observado como um dos comportamentos coletivos mais significativos e sinceros. O autor ressalta que não há história mais total que a participação na vida política.
Mesmo tendo passado por uma renovação de abordagem em relação aos seus objetos de estudo a História Política buscará novas fontes de pesquisa, ou seja, ela começa a desenvolver e ampliar suas buscas e com isso passa a dialogar com as amplas classes sociais, com crenças religiosas, com os meios de comunicação e até com as questões das relações internacionais. Assumindo essa postura a História Política envolve-se com as várias parcelas da sociedade e refuta definitivamente a acusação de interessar-se somente pelos grandes acontecimentos políticos relativos apenas às elites.
Outra grande acusação que recaía sobre a História Política e que acabou “caindo por terra” é a que diz respeito a seu caráter superficial e efêmero do estudo de um dado resultado eleitoral. Esse fato é indicativo para entendermos a razão pela qual a virada em relação ao estudo da história das eleições tenha ocorrido na França, pois é desse país o “título” de ter sido o primeiro a adotar o sufrágio universal.
Assim, o estudo das eleições a partir da renovada metodologia da História Política foi possível graças a uma estreita relação interdisciplinar com a Sociologia, a Ciência Política, a Lingüística e a Estatística. Essa relação se cristaliza entre os historiadores do político sem deixar de, principalmente, ser de fundo histórico.
Esse movimento de recuperação da História Política permite um melhor conhecimento das questões eleitorais, em especial a francesa, possibilitando aos historiadores do político recuperarem, segundo o autor, cerca de meio século da história da opinião pública daquele país. Comprovando com esses estudos que a História Política e o estudo das eleições podem fornecer uma série de dados que poderiam servir de alicerce para a análise e conhecimento das mentalidades e para a construção de uma história do cotidiano.
Outro tema tão importante e ao mesmo tempo carregado de controvérsias e discussões tanto quanto a questão da História Política é o debate sobre a chamada História do Presente. Esse ramo historiográfico surgiu marcado por um certo preconceito, como assinalam CHAUVEU e TÉTART (1999), em que os próprios historiadores em geral depositavam pouca atenção e davam pouca importância aos acontecimentos históricos recentes. Assim em outras palavras os autores afirmam que a Nova História ignorou o estudo do presente e que para a comunidade acadêmica, mergulhada nos grandes acontecimentos do passado, o estudo do presente seria uma tarefa menor e, portanto, caberia aos sociólogos, politólogos e alguns poucos grandes historiadores.
Com a chegada do século XX e seu turbilhão de acontecimentos, entre eles as duas Guerras Mundiais, a Era Atômica, a conquista do espaço, a Guerra Fria, a Primavera de 68, o colapso do leste europeu, etc., a noção de História adquire um sentido que, para RIOUX (1996), é de certa forma original e ímpar, pois passa a ser escrita pelos próprios personagens que estavam vivenciando esses fatos.
Como efeito desse conjunto de acontecimentos, em especial, logo após a Segunda Guerra o que se observou é que muitos universitários e intelectuais começaram a externar suas opiniões sobre os acontecimentos imediatos utilizando os meios de comunicação, com destaque para os jornais e revistas.
A partir da segunda metade dos anos cinqüenta teve uma intensa aproximação dos historiadores com as análises dos fatos do presente. Esse movimento teve seu ápice em 1978 quando foi criado o Intitut d’Histoire du Temps Présent, esse órgão cumpriu o papel de lançar para dentro da academia a reflexão sobre a História do Presente.Dessa forma, a História do Presente tem a marca de um segmento historiográfico que surge mais para sanar a demanda por análises dos fatos imediatos do que por um imperativo historiográfico.
Como efeito colateral da busca por análises e interpretações dos acontecimentos do presente os historiadores passaram a “dividir seu espaço” com os jornalistas. Esse fato possibilitou um encontro de conveniências, pois se, de um lado existiam historiadores sedentos de atualidade, do outro existiam jornalistas em busca de legitimidade histórica.
Esse encontro deixou algumas marcas em ambos os lados. Os historiadores “tomaram emprestado” dos jornalistas um estilo mais objetivo de escrever, práticas novas de pesquisa, de entrevista, de pesquisa de campo, escolha de temas, de atores, etc.
Essa “co-produção” também criou problemas no sentido de estreitar o contato com o poder da mídia, em especial da TV pois alguns historiadores passaram a invadir milhares de lares expressando suas opiniões sobre os acontecimentos.Isso teria criado um hábito ruim no sentido de alimentar continuamente o público com furos de reportagem, ou seja, essa necessidade estimulou a supervalorização de qualquer novo acontecimento, assim, fatos normais foram transformados pelo enfoque da mídia em “momentos históricos”, ou pior, qualquer acontecimento de maior relevância passou a ser tratado como uma “mudança nos rumos da história”.
A História do Presente foi primeiro marcada pelo selo jornalístico tendo em vista que ela pode ser considerada como cria da imprensa. Mesmo com o fator cronológico como fonte de estudo e tendo os jornalistas como “companheiros de viagem” os historiadores devem ter claro, segundo BERNSTEIN e MILZA (1996), que a história do presente é primeiramente é antes de tudo um ramo da História.
Os autores vão mais fundo na tentativa de traçar e demarcar o campo epistemológico em que atuam, ou deveriam atuar, os historiadores do presente e “...que por seus objetivos, seus métodos, suas fontes, a história do presente não difere em nada da história do século XX ...” (BERNSTEIN; MILZA, 1996, p.127).
Deste modo os historiadores souberam desenvolver métodos próprios no sentido de aprofundar sua abordagem dos fatos imediatos na direção de decodificar as informações das entrevistas, das testemunhas orais para que sua reflexão estivesse embasada dentro do ponto de vista cientifico e metodológico. Assim, com sua visão concentrada nessa meta, os historiadores garantiriam o rumo cientifico sem que essa busca, cada vez mais urgente e sedenta por análises e notícias do imediato, pudesse ter seu foco desviado.
Outro tema que passou a concentrar a atenção dos historiadores adeptos da “nova história política” foi o relativo as questões de caráter subjetivo, em especial sobre a cultura política. Um historiador símbolo desse movimento foi Serge Berstein, sendo o seu trabalho, A cultura política, uma das obras de referência sobre o tema.
Esse autor inicia seu texto fazendo um levantamento histórico sobre o termo cultura política. O resultado é a descoberta que o papel principal desse conceito é duplo, ou seja, ele mostra que nesse caso, evocar o passado tem como único intuito justificar os atos e ações do plano futuro.
Outro importante ponto levantado pelo autor é concluir que existiriam na verdade culturas políticas que poderiam coexistir no mesmo tempo e lugar, mesmo que, a principio, pareçam contraditórias. Por exemplo, o autor cita as culturas políticas do socialismo e da república e toda a problemática histórica existente entre ambas, ressaltando as características em comum que elas compartilhavam. Num processo que se desenvolve ao longo do tempo, a cultura política acaba sendo moldada e, ao mesmo tempo, moldando o comportamento da sociedade.
Em seguida, o autor realiza um levantamento dos locais em que a Cultura Política seria formada, destacando entre eles: a família, a escola, o exército e por fim o ambiente das agremiações políticas. Assim, é possível traçar um panorama amplo sobre as origens das manifestações que dariam sustentação às variadas fontes e formas de demonstração das culturas políticas. Em todos os ambientes citados ficam evidentes duas questões: primeiro que a construção da cultura política é histórica e, em segundo lugar, que ela acaba sendo elaborada em função da conjuntura de cada grupo social.
A tarefa principal do trabalho de Serge Berntein é verificar que o termo cultura política é plural, ou seja, que pode ser empregado para analisar as mais variadas manifestações e que também atende aos mais variados segmentos sociais. Ou seja, cada época e cada grupo social teriam suas próprias culturas políticas e o estudo dessas culturas políticas seria um importante instrumento de entendimento da realidade.
Além de variar entre os planos coletivo e individual, as culturas políticas também forneceriam uma visão compartilhada do passado que poderia se manifestar através de símbolos, canções, gestos que seriam, de fato, verdadeiros rituais que dariam sentido e coesão a um determinado elenco de atores políticos.
Portanto, as atuais pesquisas que pretendem abordar temas ligados à História Política têm uma parada obrigatória nos escritos de Serge Berstein. Esse autor, que é um dos mais conhecidos no campo da História Política, tem como maior mérito o fato de trazer à luz a noção de pluralidade das abordagens das culturas políticas. Nessa lógica, lançar um novo olhar sobre a História Política é compreender que mesmo as manifestações de cultura política aparentemente de características mais antagônicas, como as democráticas e as autoritárias, podem e devem ser valiosos objetos de estudos.
Como se vê, as abordagens suscitaram a utilização de um conjunto de novos elementos entre as ferramentas teóricas e metodológicas da história política. Temas que anteriormente não figuravam no elenco da história política de viés “tradicional”, muito afeitas somente a identificar as ações conscientemente planejadas dentro do campo político (que, por outro lado, em nossa concepção, não devem ser desconsideradas).
Assim, essa prática deixava de lado, portanto, a análise de determinados comportamentos políticos que “não se explicam somente pela vontade, pelo interesse ou por ações concentradas no plano racional”, mas também “pela crença, pela fé, pela força da tradição e do costume e por determinações originadas no plano do inconsciente”.
Nas últimas décadas trabalhos que buscavam ampliar o campo de pesquisa da história política passaram a desenvolver investigações sobre as culturas políticas, representações políticas, análise do discurso, rituais políticos, iconografia política, entre outros temas.
Referências Bibliográficas
BERNSTEIN, Serge; MILZA, Pierre. Conlusão. IN: Remond, Réne. Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
BERSTAEIN, Serge. A Cultura Política. IN: Para uma História Cultural. RIOUX, Jean-Pierre; SIRINELLI, Jean- François (ORG). Lisboa: Editorial Estampa, 1999.
BORGES, Vany Pacheco. História e Política: laços permanentes. In: Revista Brasileira de História. S. Paulo, v.12, nº 23/24, p. 07 –18. set 91/ago. 92.
CHAUVEU, Agnes; TÉRTART, Phillippe. (org.). Questões para a história do presente. Bauru-SP. Edusp, 1999.
JANOTTI, Maria de Lourdes Mônaco. História, Política e ensino. .IN: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula.São Paulo. São Paulo: Contexto, 1998.
REMOND, René (org). Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/ FVG, 1996.
RIOUX, Jean-Pierre. Pode-se fazer uma História do Presente. IN: RÉMOND, René (ORG.) . Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
RIOUX, Jean-Pierre.Entre História e Jornalismo. IN: REMOND, René. Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
Dessa forma, a História Política já guardava em seu nascedouro a marca clara de uma disciplina que buscaria os grandes embates do Estado, pelo poder e em busca das conquistas ou das revoluções que buscavam transformar a sociedade, ou seja, essas eram as fontes pioneiras de suas pesquisas. Assim, de acordo com RÉMOND (1996), através de uma metodologia Positivista, a História Política Tradicional relatava as glórias dos “grandes governantes” do passado. Porém, essa forma de fazer história, que foi hegemônica por um longo período, sofreu um abalo que há cinqüenta anos atingiu todos os campos da História.
A partir do surgimento da Nova História a História Política passa a ser “acusada” de, como já foi dito, ser uma história tradicional, conjuntural, obsoleta, desusada, factual, subjetivista, psicologizante, enfim, passa a ser impiedosamente criticada e refutada . Na visão do autor essa recusa pelo político fez com que no meio acadêmico a História Política fosse execrada e descartada e as questões econômicas e as relações sociais passassem a ditar todo o rumo das pesquisas históricas.
A reviravolta que possibilitou à História Política ter novamente um papel de destaque dentro do campo histórico foi, sem dúvida, a evolução e o aumento das atribuições do Estado, ou seja, para o autor o universo das questões políticas também se expandiu e diversificou a participação e o número de atores sociais na vida política.
Dessa forma, surge a brecha para a História Política, pois, esses novos temas analisados apenas pelo prisma econômico ou social não conseguiam ser plenamente compreendidos fora do ângulo historiográfico, ou seja, não conseguiam dar conta das novas demandas do campo político. A História Política retoma seu lugar de destaque, porém para p autor, a História Política ao olhar para esses novos fatos acaba tendo que renovar também sua metodologia para poder interpretar com rigor a realidade política e ideológica de sua época.
No caso, a renovação foi provocada, suscitada pela discussão dos conceitos clássicos e das praticas tradicionais. E nesse ponto, a constatação de que foi objeto a história política lhe foi salutar: o desafio fustigou a imaginação e estimulou a iniciativa. ( RÉMOND, 1996, p.26)
Além da mudança em seus conceitos a História Política irá enfrentar um grande debate sobre a fundamentação teórica e a metodologia de seus estudos, em especial, para o autor no que diz respeito ao sentido histórico das eleições, ou seja, sobre caráter passageiro e localizado de cada pleito ou, ao contrário, se existiria um comportamento ou padrão entre as várias parcelas da sociedade contemporânea durante um processo eleitoral.
O estudo do sufrágio universal, da abstenção, da participação popular e dos trabalhadores, enfim, todos esses aspectos são vistos e revistos pelos historiadores do político e a partir daí o ato eleitoral passa a ser observado como um dos comportamentos coletivos mais significativos e sinceros. O autor ressalta que não há história mais total que a participação na vida política.
Mesmo tendo passado por uma renovação de abordagem em relação aos seus objetos de estudo a História Política buscará novas fontes de pesquisa, ou seja, ela começa a desenvolver e ampliar suas buscas e com isso passa a dialogar com as amplas classes sociais, com crenças religiosas, com os meios de comunicação e até com as questões das relações internacionais. Assumindo essa postura a História Política envolve-se com as várias parcelas da sociedade e refuta definitivamente a acusação de interessar-se somente pelos grandes acontecimentos políticos relativos apenas às elites.
Outra grande acusação que recaía sobre a História Política e que acabou “caindo por terra” é a que diz respeito a seu caráter superficial e efêmero do estudo de um dado resultado eleitoral. Esse fato é indicativo para entendermos a razão pela qual a virada em relação ao estudo da história das eleições tenha ocorrido na França, pois é desse país o “título” de ter sido o primeiro a adotar o sufrágio universal.
Assim, o estudo das eleições a partir da renovada metodologia da História Política foi possível graças a uma estreita relação interdisciplinar com a Sociologia, a Ciência Política, a Lingüística e a Estatística. Essa relação se cristaliza entre os historiadores do político sem deixar de, principalmente, ser de fundo histórico.
Esse movimento de recuperação da História Política permite um melhor conhecimento das questões eleitorais, em especial a francesa, possibilitando aos historiadores do político recuperarem, segundo o autor, cerca de meio século da história da opinião pública daquele país. Comprovando com esses estudos que a História Política e o estudo das eleições podem fornecer uma série de dados que poderiam servir de alicerce para a análise e conhecimento das mentalidades e para a construção de uma história do cotidiano.
Outro tema tão importante e ao mesmo tempo carregado de controvérsias e discussões tanto quanto a questão da História Política é o debate sobre a chamada História do Presente. Esse ramo historiográfico surgiu marcado por um certo preconceito, como assinalam CHAUVEU e TÉTART (1999), em que os próprios historiadores em geral depositavam pouca atenção e davam pouca importância aos acontecimentos históricos recentes. Assim em outras palavras os autores afirmam que a Nova História ignorou o estudo do presente e que para a comunidade acadêmica, mergulhada nos grandes acontecimentos do passado, o estudo do presente seria uma tarefa menor e, portanto, caberia aos sociólogos, politólogos e alguns poucos grandes historiadores.
Com a chegada do século XX e seu turbilhão de acontecimentos, entre eles as duas Guerras Mundiais, a Era Atômica, a conquista do espaço, a Guerra Fria, a Primavera de 68, o colapso do leste europeu, etc., a noção de História adquire um sentido que, para RIOUX (1996), é de certa forma original e ímpar, pois passa a ser escrita pelos próprios personagens que estavam vivenciando esses fatos.
Como efeito desse conjunto de acontecimentos, em especial, logo após a Segunda Guerra o que se observou é que muitos universitários e intelectuais começaram a externar suas opiniões sobre os acontecimentos imediatos utilizando os meios de comunicação, com destaque para os jornais e revistas.
A partir da segunda metade dos anos cinqüenta teve uma intensa aproximação dos historiadores com as análises dos fatos do presente. Esse movimento teve seu ápice em 1978 quando foi criado o Intitut d’Histoire du Temps Présent, esse órgão cumpriu o papel de lançar para dentro da academia a reflexão sobre a História do Presente.Dessa forma, a História do Presente tem a marca de um segmento historiográfico que surge mais para sanar a demanda por análises dos fatos imediatos do que por um imperativo historiográfico.
Como efeito colateral da busca por análises e interpretações dos acontecimentos do presente os historiadores passaram a “dividir seu espaço” com os jornalistas. Esse fato possibilitou um encontro de conveniências, pois se, de um lado existiam historiadores sedentos de atualidade, do outro existiam jornalistas em busca de legitimidade histórica.
Esse encontro deixou algumas marcas em ambos os lados. Os historiadores “tomaram emprestado” dos jornalistas um estilo mais objetivo de escrever, práticas novas de pesquisa, de entrevista, de pesquisa de campo, escolha de temas, de atores, etc.
Essa “co-produção” também criou problemas no sentido de estreitar o contato com o poder da mídia, em especial da TV pois alguns historiadores passaram a invadir milhares de lares expressando suas opiniões sobre os acontecimentos.Isso teria criado um hábito ruim no sentido de alimentar continuamente o público com furos de reportagem, ou seja, essa necessidade estimulou a supervalorização de qualquer novo acontecimento, assim, fatos normais foram transformados pelo enfoque da mídia em “momentos históricos”, ou pior, qualquer acontecimento de maior relevância passou a ser tratado como uma “mudança nos rumos da história”.
A História do Presente foi primeiro marcada pelo selo jornalístico tendo em vista que ela pode ser considerada como cria da imprensa. Mesmo com o fator cronológico como fonte de estudo e tendo os jornalistas como “companheiros de viagem” os historiadores devem ter claro, segundo BERNSTEIN e MILZA (1996), que a história do presente é primeiramente é antes de tudo um ramo da História.
Os autores vão mais fundo na tentativa de traçar e demarcar o campo epistemológico em que atuam, ou deveriam atuar, os historiadores do presente e “...que por seus objetivos, seus métodos, suas fontes, a história do presente não difere em nada da história do século XX ...” (BERNSTEIN; MILZA, 1996, p.127).
Deste modo os historiadores souberam desenvolver métodos próprios no sentido de aprofundar sua abordagem dos fatos imediatos na direção de decodificar as informações das entrevistas, das testemunhas orais para que sua reflexão estivesse embasada dentro do ponto de vista cientifico e metodológico. Assim, com sua visão concentrada nessa meta, os historiadores garantiriam o rumo cientifico sem que essa busca, cada vez mais urgente e sedenta por análises e notícias do imediato, pudesse ter seu foco desviado.
Outro tema que passou a concentrar a atenção dos historiadores adeptos da “nova história política” foi o relativo as questões de caráter subjetivo, em especial sobre a cultura política. Um historiador símbolo desse movimento foi Serge Berstein, sendo o seu trabalho, A cultura política, uma das obras de referência sobre o tema.
Esse autor inicia seu texto fazendo um levantamento histórico sobre o termo cultura política. O resultado é a descoberta que o papel principal desse conceito é duplo, ou seja, ele mostra que nesse caso, evocar o passado tem como único intuito justificar os atos e ações do plano futuro.
Outro importante ponto levantado pelo autor é concluir que existiriam na verdade culturas políticas que poderiam coexistir no mesmo tempo e lugar, mesmo que, a principio, pareçam contraditórias. Por exemplo, o autor cita as culturas políticas do socialismo e da república e toda a problemática histórica existente entre ambas, ressaltando as características em comum que elas compartilhavam. Num processo que se desenvolve ao longo do tempo, a cultura política acaba sendo moldada e, ao mesmo tempo, moldando o comportamento da sociedade.
Em seguida, o autor realiza um levantamento dos locais em que a Cultura Política seria formada, destacando entre eles: a família, a escola, o exército e por fim o ambiente das agremiações políticas. Assim, é possível traçar um panorama amplo sobre as origens das manifestações que dariam sustentação às variadas fontes e formas de demonstração das culturas políticas. Em todos os ambientes citados ficam evidentes duas questões: primeiro que a construção da cultura política é histórica e, em segundo lugar, que ela acaba sendo elaborada em função da conjuntura de cada grupo social.
A tarefa principal do trabalho de Serge Berntein é verificar que o termo cultura política é plural, ou seja, que pode ser empregado para analisar as mais variadas manifestações e que também atende aos mais variados segmentos sociais. Ou seja, cada época e cada grupo social teriam suas próprias culturas políticas e o estudo dessas culturas políticas seria um importante instrumento de entendimento da realidade.
Além de variar entre os planos coletivo e individual, as culturas políticas também forneceriam uma visão compartilhada do passado que poderia se manifestar através de símbolos, canções, gestos que seriam, de fato, verdadeiros rituais que dariam sentido e coesão a um determinado elenco de atores políticos.
Portanto, as atuais pesquisas que pretendem abordar temas ligados à História Política têm uma parada obrigatória nos escritos de Serge Berstein. Esse autor, que é um dos mais conhecidos no campo da História Política, tem como maior mérito o fato de trazer à luz a noção de pluralidade das abordagens das culturas políticas. Nessa lógica, lançar um novo olhar sobre a História Política é compreender que mesmo as manifestações de cultura política aparentemente de características mais antagônicas, como as democráticas e as autoritárias, podem e devem ser valiosos objetos de estudos.
Como se vê, as abordagens suscitaram a utilização de um conjunto de novos elementos entre as ferramentas teóricas e metodológicas da história política. Temas que anteriormente não figuravam no elenco da história política de viés “tradicional”, muito afeitas somente a identificar as ações conscientemente planejadas dentro do campo político (que, por outro lado, em nossa concepção, não devem ser desconsideradas).
Assim, essa prática deixava de lado, portanto, a análise de determinados comportamentos políticos que “não se explicam somente pela vontade, pelo interesse ou por ações concentradas no plano racional”, mas também “pela crença, pela fé, pela força da tradição e do costume e por determinações originadas no plano do inconsciente”.
Nas últimas décadas trabalhos que buscavam ampliar o campo de pesquisa da história política passaram a desenvolver investigações sobre as culturas políticas, representações políticas, análise do discurso, rituais políticos, iconografia política, entre outros temas.
Referências Bibliográficas
BERNSTEIN, Serge; MILZA, Pierre. Conlusão. IN: Remond, Réne. Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
BERSTAEIN, Serge. A Cultura Política. IN: Para uma História Cultural. RIOUX, Jean-Pierre; SIRINELLI, Jean- François (ORG). Lisboa: Editorial Estampa, 1999.
BORGES, Vany Pacheco. História e Política: laços permanentes. In: Revista Brasileira de História. S. Paulo, v.12, nº 23/24, p. 07 –18. set 91/ago. 92.
CHAUVEU, Agnes; TÉRTART, Phillippe. (org.). Questões para a história do presente. Bauru-SP. Edusp, 1999.
JANOTTI, Maria de Lourdes Mônaco. História, Política e ensino. .IN: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula.São Paulo. São Paulo: Contexto, 1998.
REMOND, René (org). Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/ FVG, 1996.
RIOUX, Jean-Pierre. Pode-se fazer uma História do Presente. IN: RÉMOND, René (ORG.) . Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
RIOUX, Jean-Pierre.Entre História e Jornalismo. IN: REMOND, René. Por uma história política. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/FVG, 1996.
esse trabalho me ajudou um pouco mas queria algo mais crítico, que me resbaldasse em uma maior bagagem.
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